Entra em jogo a validade do voto
A desilusão dos eleitores com os políticos em função da série de escândalos que se abateu sobre o governo Lula e o Congresso Nacional produziu um fenômeno que vem crescendo dia a dia em todo o país: a opção pelo voto nulo nas eleições de outubro. Vários movimentos estão sendo difundidos pela Internet e por meio da maior rede de relacionamentos do mundo, o Orkut. Mais de 35 mil pessoas estão engajadas na defesa da anulação do voto como forma de protesto, distribuídas em 330 comunidades. Apenas seis grupos se formaram no Orkut contra o voto nulo para tentar combater a iniciativa.
O Código Eleitoral legitima a forma de protesto. De acordo com a lei, se mais da metade dos votos apurados forem nulos, a eleição acabará prejudicada. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, 123.528.026 brasileiros poderão comparecer às urnas este ano. Então, pela regra, a disputa vai se tornar inválida se 61.764.014 pessoas anularem. Nesse caso, o TSE terá que convocar nova disputa em 40 dias. Dela, porém, poderão participar todos os que concorreram na eleição anulada, gerando círculo vicioso.
O presidente do Tribunal Regional Eleitoral, desembargador Roque Miguel Fank, afirmou, neste sábado (6/5), que compreende as manifestações contra o voto válido. Ele argumentou que as promessas não cumpridas e as irregularidades cometidas sistematicamente por políticos provocaram clima de indignação. Cresceu muito o descompasso entre as quimeras prometidas pelos políticos e o que acaba sendo realizado de fato. Isso levou à desesperança", avaliou. Segundo Fank, as movimentações pela anulação do voto têm sentido positivo, por estabelecerem cobrança forte para que o político respeite mais o eleitor. "Os políticos precisam entender que as pessoas não são imaturas e que esperam pelos resultados propostos durante a campanha", disse. Apesar de entender o protesto, Fank fez um apelo para que os eleitores participem por meio do voto válido. Argumentou que ele deve se tornar instrumento de cobrança e refletir grau de exigência dos eleitores.
O advogado Joel José Cândido, especialista em Direito Eleitoral, não acredita que a mobilização tenha resultado efetivo, levando à anulação das eleições. Ele argumentou que o colégio eleitoral para as disputas presidencial e aos governos estaduais é gigantesco. Salientou, porém, que possivelmente a insatisfação das pessoas representará aumento do percentual de votos nulos, que fica em torno de 15% a 20%.
Renovação varre a Câmara e a Assembléia
A vontade de acertar o voto levou os eleitores, nos últimos anos, a promoverem grande rodízio na Câmara dos Deputados e na Assembléia Legislativa. Os percentuais de renovação, de 1990 a 2002, atingiram, no Rio Grande do Sul média de 50% e, em Brasília, de 42%. A ilusão de eleger um "grande político", que não se envolva em corrupção e em escândalos e que realmente trabalhe é, para a cientista política e professora da UFRGS, Céli Pinto, o motivo das mudanças observadas no comportamento do eleitor há algum tempo.
Há quatro anos, na última eleição geral, 40% das vagas na Assembléia passaram por mudanças: dos 55 deputados estaduais, 33 deixaram os mandatos e 22 retornaram ao cargo. Entre os 31 deputados federais eleitos pelo Rio Grande do Sul, 12 novos assumiram. Na Câmara dos Deputados, a renovação foi menor. Do total de 513 eleitos, 329 conseguiram se reeleger. Nas eleições de 1998, os percentuais de renovação nos legislativos variaram de 35,7% a 47,2%. Na Câmara dos Deputados, permaneceram nos cargos 330 parlamentares. Entre os deputados federais gaúchos, 18 se reelegeram. Na Assembléia, a renovação chegou a 47,2%: 23 novos deputados assumiram, enquanto 32 se reelegeram.
Passados o episódio do impeachment de Fernando Collor de Mello e a chegada do Plano Real, os legislativos estadual e nacional mudaram radicalmente a composição, alcançando índices de renovação altos em comparação às eleições de 1998 e de 2002: o percentual de novos deputados no Estado atingiu 60%, ou seja, dos 55, apenas 22 conseguiram se reeleger.