Judiciário vai cortar gratificações
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que em março deverá editar uma resolução contra os supersalários no Judiciário, identificou 40 tipos de gratificações e adicionais pagos hoje a magistrados. Os extras abrem brechas para que o teto salarial no serviço público, de R$ 24,5 mil, seja desrespeitado. O Correio apurou que, dos cerca de 14 mil magistrados do país, entre 2 e 3 mil recebem salários acima do teto.
Na reunião do Conselho do dia 16 de março, a resolução deverá ser apresentada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do CNJ, ministro Nelson Jobim. Uma primeira versão do texto está sendo rascunhada por técnicos e assessores do órgão. Ela prevê somente três exceções na computação do cálculo do teto. Não serão levados em conta os vencimentos extras recebidos por magistrados designados para trabalhar na Justiça Eleitoral, nem os pagamentos a juízes, ministros e desembargadores por darem aula em universidades públicas. A terceira exceção diz respeito às verbas indenizatórias, pagas, por exemplo, quando o magistrado viaja a serviço e, por isso, recebe diárias.
Como o tema é bastante polêmico e esta é apenas uma primeira versão do documento, é possível que modificações sejam feitas quando o plenário do CNJ deliberar sobre a questão.
Em 2005, uma lei determinou que ninguém no serviço público poderia receber mais do que os R$ 24,5 mil pagos aos ministros do STF. A regra, entretanto, é desrespeitada em vários tribunais por conta de leis estaduais que permitem gratificações extras aos magistrados. Há casos em que os salários ultrapassam os R$ 40 mil.
Resistência
Com o fim do nepotismo no Judiciário, o Conselho passou a se concentrar no teto salarial. Jobim, que tem pressa para votar o tema porque em março deixa o Judiciário, fez uma série de reuniões nas últimas semanas com representantes de diferentes tribunais para discutir o assunto. O ministro sabe que a questão salarial tende a sofrer ainda mais resistência do que a do nepotismo.
Na última segunda-feira, durante encontro com representantes de tribunais de contas da União e dos Estados, Jobim teve uma prévia do que deve se repetir nas próximas semanas. Discorria, na reunião, sobre as verbas que se sujeitariam ao teto quando foi interrompido por Flávio Régis, conselheiro do TCU de Minas Gerais. Régis alegava que o teto não dizia respeito ao TCU. O presidente do STF passou a ler a Constituição para argumentar com o conselheiro, que o interrompeu repetidas vezes, alterado. Jobim então questionou se o conselheiro recebia acima do teto. “Recebo o que a lei me garante”, respondeu o conselheiro, que logo depois deixou a reunião. Mesmo com a evidente resistência, Jobim está convicto que o Conselho editará a norma ainda em março. “Eu não acho que nós vamos votar em março. Eu tenho certeza”, disse ontem, no intervalo de sessão do STF.
A tendência é a resolução ser aprovada no Conselho e, logo depois, ter início a concessão de uma onda de liminares para tentar barrar a resolução, tal qual aconteceu com o nepotismo. Os conselheiros também estão certos de que o caso irá, mais uma vez, parar no STF. Embora o CNJ só discipline a questão no Judiciário, a norma acabará incidindo sobre toda a administração pública.
Também em março, antes de o CNJ emitir a resolução do teto, o STF julgará um mandado de segurança movido por representantes de quatro ministros do Supremo — Francisco Xavier de Albuquerque (1972 a 1983), Oscar Dias Côrrea (1982 a 1989), Djaci Alvez Falcão (1967 a 1989) e Luiz Rafael Mayer (1978 a 1989). Eles se aposentaram antes da lei que fixava o teto e, por isso, recebiam gratificações. Os benefícios foram cortados e, agora, eles querem reavê-los, alegando “direito adquirido”. Ontem, o STF não informou o valor do salário atual dos ex-ministros. O resultado deste julgamento terá impacto na resolução do CNJ.
Fonte: Jornal Correio Braziliense, em 23/2