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Operação Lava Jato: quem não souber jogar, vai perder

O procurador de Justiça Fábio Costa Pereira elaborou, em parcedia com o professor Marcelo Berger, um artigo em que analisa o trabalho do Ministério Público, especialmente na Operação Lava Jato, e os movimentos no Congresso Nacional para barrar as investigações e intimidar juízes, procuradores e promotores de Justiça com medidas restritivas e a desvirtuação do projeto Dez Medidas contra a Corrupção.
07/12/2016 Atualizada em 21/07/2023 11:01:35
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O procurador de Justiça Fábio Costa Pereira elaborou, em parcedia com o professor Marcelo Berger, um artigo em que analisa o trabalho do Ministério Público, especialmente na Operação Lava Jato, e os movimentos no Congresso Nacional para barrar as investigações e intimidar juízes, procuradores e promotores de Justiça com medidas restritivas e a desvirtuação do projeto Dez Medidas contra a Corrupção. Confira aqui o texto.



OPERAÇÃO LAVA JATO: QUEM NÃO SOUBER JOGAR, VAI PERDER

Fábio Costa Pereira e Marcelo Berger



Imaginem os leitores que, na rua em que vocês moram, metade dos seus amigos e vizinhos esteja sendo processada ou investigada criminalmente. Imaginem, ainda, que os seus vizinhos são pessoas poderosas, com a capacidade de reagir às justas acusações que lhes são endereçadas. Imaginem, ainda, que os seus vizinhos podem legislar em causa própria e amordaçar, através de leis por eles mesmos elaboradas, aqueles que os estão investigando.

Pois bem, não é necessário qualquer esforço imaginativo, o quadro retratado é a triste realidade do Brasil atual, onde expressiva parcela do Congresso Nacional, que ocupa o papel de indesejado vizinho, investigada e processada por conta das descobertas feitas através da Operação Lava Jato, está tentando subjugar pessoas e instituições que ousaram trazer à luz os crimes praticados. É necessário entender o que e o porque da reação. Recorreremos, ainda que brevemente, à Teoria dos Jogos para explicar os acontecimentos e as reações.

O terremoto causado pela operação Lava-jato e seus desdobramentos guardam relação direta com aspectos até então desconhecidos do mundo jurídico brasileiro. Trata-se do uso intensivo de mecanismos já utilizados em outros países no combate às organizações criminosas envolvidas em atos de corrupção, e que agora, com relativo atraso, estão chegando ao Brasil.

Claro que, como qualquer novidade, chega recheada de controvérsias, acusações, avanços, retrocessos, intensa luta de bastidores e, acima de tudo, muito desconhecimento.  O fato é que qualquer brasileiro hoje pode apreciar através dos inúmeros canais de mídia disponíveis as escaramuças narradas quase em forma de capítulos de uma novela. Diária e incessantemente, sempre versando sobre termos muitas vezes estranhos à comunidade jurídica, senão vejamos alguns: estratégias, ameaças, blefes, recompensas, informação assimétrica, sinalização, risco, resultados esperados, probabilidades, dilema do prisioneiro, entre outros inúmeros exemplos. Se o prezado leitor é apenas um interessado ávido ou operador do direito e demonstra pouca familiaridade com esta terminologia associada a um assunto tão próximo da realidade mais severa e grave do mundo jurídico penal aplicado, então revelamos a novidade: seja bem-vindo à Análise Econômica do Direito. No caso da Lava-jato, Análise Econômica do Crime. Este é o mundo maravilhoso da teoria dos jogos aplicada ao direito. Sim, aquela teoria dos jogos que nos brindou alguns anos atrás com um grande filme que narrava de forma ficcional a vida de um dos maiores economistas e matemáticos da história: John Forbes Nash Jr. Tudo o que hoje é observado com enorme ansiedade e surpresa nos noticiários sobre a Lava-jato é um desdobramento direto desta que é uma das mais nobres e espetaculares especialidades da ciência econômica, fartamente utilizada nos tribunais norte-americanos e que finalmente chega ao Brasil através das mãos da força-tarefa em Curitiba que comanda as operações de combate ao crime organizado, formada pelo tripé Polícia Federal, Ministério Público Federal e Justiça Federal, todos utilizando com enorme maestria a ciência econômica aplicada ao comportamento estratégico para efetivar um dos pilares fundamentais da ação penal, quais sejam, a busca de indícios inequívocos de materialidade e autoria para assim obter o fundamento necessário para condenar nos estritos termos da lei penal o maior esquema de corrupção jamais identificado no País e, comprovadamente, um dos maiores da história mundial em sua capilaridade, tempo de ocorrência e valores envolvidos. Observe-se que graças à quantidade inacreditável de provas obtidas, o noticiário sobre o tema evolui freneticamente sempre com novos movimentos, novas iniciativas, declarações desencontradas, novos envolvidos, velhos envolvidos, novas estratégias, enfim, um jogo que parece nunca acabar. Sim, trata-se de um jogo. Um jogo no qual o direito representa um parte importante, mas longe de ser o ator principal. Este jogo envolve muito dinheiro, figuras poderosas, muita inteligência e profundo conhecimento sobre comportamento humano, análise custo-benefício e aversão ao risco. São inúmeros jogadores interagindo estrategicamente entre si, de forma simultânea e sequencial, usando diversas artimanhas, legais ou não, para obter um resultado determinado pelas regras que regulam este jogo e pelas informações obtidas nas investigações. Neste drama - previsivelmente, é bom que se diga - o último movimento foi realizado nas dependências do Congresso Nacional por diversos parlamentares na calada da madrugada, quando o País tomava conhecimento da tragédia da Chapecoense em Medellin. A votação visava apenas e tão somente alterar as regras do jogo, para assim inviabilizar os resultados pretendidos pela ação penal em andamento. O objetivo final das medidas deliberadas no Parlamento tinha como único alvo o trancamento dos atos processuais ora em curso e que envolvem parcela expressiva de figuras notórias e poderosas da política brasileira. Poucos, no entanto, perceberam que tais modificações tinham o explosivo potencial não só de acabar com a lava-jato, mas terminar inteiramente com qualquer possibilidade de efetividade da ação penal como um todo, transformando a dúvida sobre a punição por crimes praticados em absoluta certeza de impunidade. Se do jeito que está já era difícil, com as tais medidas aprovadas significaria o término da capacidade estatal de buscar a punição dos responsáveis pelos crimes praticados contra a administração pública, seu alvo declarado. Para enfrentar isso, primeiro é preciso que se reconheça que os jogadores envolvidos são brilhantes estrategistas. Para o bem e para o mal. Estão há muito tempo nesta arena.

Neste jogo bruto, sofismas e quimeras retóricas são absolutamente irrelevantes para o deslinde da disputa. De fato, a história ensina que nunca devemos subestimar as palavras proféticas de Sun Tzu: "se você não conhece nem a você, nem ao seu inimigo, perderá todas as batalhas”. Ter a informação correta é fundamental neste jogo, para posteriormente usar a estratégia adequada. Saber que o inimigo é poderoso, capaz e com muitos recursos à disposição é uma regra de ouro para vencer esta batalha. Para finalizar, deixamos para os leitores adivinharem quem são os próximos personagens a desempenhar papel importante neste jogo, além daqueles localizados em Brasília e Curitiba. Uma pista: estão em Porto Alegre. Bom jogo a todos e que o Brasil vença.

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