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Poesia, o instante nômade da eternidade: 80 anos de Carlos Nejar
Carlos Nejar é um homem do pampa, mas sua poesia é universal. Crítico
literário, ficcionista e dramaturgo, traduziu Jorge Luis Borges e Pablo
Neruda. Um dos mais importantes poetas contemporâneos. Sua obra não se
mede no espaço, não cabe no tempo. É de todos os tempos. É o pão da
palavra exata. Depois em alma apanhava/ o pão da palavra exata/ E o
tempo/na cesta se acumulava.
O poeta completa neste início de janeiro (2019) 80 anos de idade, sendo mais de 50 anos dedicados à criação. Um criador de cosmogonias, como disse o poeta pernambucano César Leal, mas também o autor da mais completa História da Literatura Brasileira, que percorre da Carta de Caminha aos dias atuais, sendo considerado um dos 37 escritores-chave do século, segundo o crítico suíço Gustav Siebenmann.
O poeta completa neste início de janeiro (2019) 80 anos de idade, sendo mais de 50 anos dedicados à criação. Um criador de cosmogonias, como disse o poeta pernambucano César Leal, mas também o autor da mais completa História da Literatura Brasileira, que percorre da Carta de Caminha aos dias atuais, sendo considerado um dos 37 escritores-chave do século, segundo o crítico suíço Gustav Siebenmann.
Jorge Trindade
Membro da Academia Brasileira de Filosofia
Procurador de Justiça inativo
Carlos Nejar é um homem do pampa, mas sua poesia é universal. Crítico literário, ficcionista e dramaturgo, traduziu Jorge Luis Borges e Pablo Neruda. Um dos mais importantes poetas contemporâneos. Sua obra não se mede no espaço, não cabe no tempo. É de todos os tempos. É o pão da palavra exata. Depois em alma apanhava/ o pão da palavra exata/ E o tempo/na cesta se acumulava.
O poeta completa neste início de janeiro (2019) 80 anos de idade, sendo mais de 50 anos dedicados à criação. Um criador de cosmogonias, como disse o poeta pernambucano César Leal, mas também o autor da mais completa História da Literatura Brasileira, que percorre da Carta de Caminha aos dias atuais, sendo considerado um dos 37 escritores-chave do século, segundo o crítico suíço Gustav Siebenmann.
A propósito, vale lembrar as palavras de João Ricardo Moderno (2016, p. 179) ao dizer: em Nejar, o fetiche da metodologia desfaz-se como gelo. Nejar é a sua própria metodologia. Não precisa de outra e a sua História da Literatura Brasileira é também um manifesto literário. Algo jamais visto desde o início do Modernismo brasileiro. Uma história com sentimentos. Uma história com lágrimas e seres vivos autênticos.
Impossível descrever toda sua obra, desde O Campeador e o Vento (1966). Primeiro, porque como apenas um leitor, não teria a menor condição de fazê-lo senão expressar o quanto a poesia de Nejar é singular e própria. Não cabe em definições. Em nenhum enquadre. Depois, porque o poeta das Quarenta e nove casidas e um amor desabitado (2016) continua a recriar a criação. Como diz em O evangelho segundo o vento: (...)Quando brota a voz humana/ não há quem a detenha.
E não há. Nem tempo nem vento. Nejar é o mais autêntico incessante carpinteiro da palavra.
Recentemente (dezembro/janeiro 2018), foi lançado, por concepção, projeto e edição dopoeta Luiz Coronel, o Dicionário Carlos Nejar. Essa publicação dá uma noção da amplitude da sua obra.
Sempre me impressionei muito com a força de sua palavra. O tom, a modulação com que Nejar exprime o afeto que nela contém. O seu aspecto sonoro é desconcertante. Simbólico. Metafórico. A capacidade de dizer. De dar nome àquilo que anda em busca de nomeação. Pois, se há sempre algo de bruto no homem – e sempre há – esse terror sem nome anseia psicologicamente ser revelado. Pela palavra deseja ser nomeado. Assim: O vento lavou as pedras,/ mas ficaram as palavras./ O vento lavou as pedras /com sabor de madrugada. / O vento lavou as noites, / mas ficaram as estrelas. / (...)/ O vento lavou as águas,/ mas não lavou a inocência/ que amadurece nas águas./ O vento lavou o vento. (Pedra-vento).
A aspereza que nos constitui desde a cena primitiva está sempre à espera de ser polida. A difícil tarefa de transformar a pedra em diamante do afeto. Temos, sim, uma parte disforme dentro de nós, inacabada, inaudita, que busca desesperada e agonicamente uma saída somente possível pela nomeação do eu-palavra. A poesia existe, disse Ferreira Gullar, porque a vida só não basta. Necessita o desvelamento, a atribuição de sentido, daquilo que ainda não tem nome nem pensamento.
A palavra de Nejar, a par de seu vigor audível, decodifica esse material arcaico na medida em que amassa o barro de que é feito o homem, para usar uma imagem de Saramago. O homem que se renasce em cada decifração da palavra. O-sem-significado prende. O sentido compreende. A nomeação liberta. Esse processo de atribuição de sentido em Carlos Nejar passa e perpassa pelo que é sentido. É por isso que as personagens nejarianas se chamam viventes.São vivas em nós e nós somos vivos nelas.
Na bricolagem em que apsicanálise diz: onde o homem pensa, ele não existe, e onde ele existe, ele é lá que ele não pensa, Nejar faz interpretação artística. O ato de atribuir sentido está no inconsciente, não no discurso técnico de uma bula de laboratório. Neste tudo está dito.
A poesia, assim como o ato de descoberta científica, da sentença justa e do encontro místico, está inscrita no mesmo registro de encontro privilegiado com a verdade e com a ternura. Assim, permito-me dizer que poesia de Nejar produz a transformação de nossos elementos beta/brutos em elementos alfa. Resgata, pela mão da palavra, cada um de nós do terror-sem-nome para nos conduzir à condição de sujeito, que é sempre da cultura. Não há terror como/o que já se deu,/ antes de acontecer.
A poesia de Carlos Nejar, dessa forma, deixa fluir o inconsciente. As palavras, os sons, as tonalidades organizam-se através dessa outra percepção, sem tempo, sem espaço. Sem demarcações e sem barreiras. É repleta de condensações e deslocamentos. O ponto de capitonê amarra surpreendentes configurações. Uma palavra sempre outra. Mimetismo do eu. Caleidoscópio de sentidos. Ela se desloca na busca de significados para além do sentido. Sempre ali. Nunca ali. A poesia de Nejar é o pote de ouro de baixo do arco-íris. Palavra-movimento, que não se banha duas vezes na água do mesmo rio. Já é outra novamente. Palavra instante, trovão. Luz e escuridão. É o inconsciente em constante metaforização. Vida, vela, vento, sopro que faz as palavras se abraçarem nelas mesmas. Uma lógica-caesura, que, ao romper, costura. Ao costurar, rompe. É a saga do dizer o nunca antes pensado, intransponível. Sua poesia faz que se torne possível penetrar a inacessibilidade do ser. Por isso é lindeira do trágico.
Nejar é o pensador de pensamentos jamais pensados. Como pensar e dizer o que nunca foi pensado nem dito? Só pela ascese da palavra.
Em Nejar toda palavra é mundo, todo verso é combate. O resto é vento. O vento é o vento;/ as crinas não rompem / o silêncio/ e ao seu galope / retumba a água, / prossegue sempre, / até que o tempo/ desmonte a morte, / no seu galope, / desmonte o tempo. / Prossegue sempre (O Campeador com as rédeas do tempo).
Dessa forma, a poesia de Carlos Nejar nunca volta atrás. Ela faz (re)viver experiências emocionais corretivas do eu na relação de encontro com outros sentidos-viventes.O tempo é gente./Jamais se apossa/ do que não lhe sofre (Idade da aurora).
Em poema-homenagem, Gilberto Mendonça Teles (2017) retrata bem o poeta maior: O verbo nunca esteve no início/ dos grande acontecimentos./ (...) No início ou no fim (tudo é finício)/ a gente lembra de que está mesmo com Deus/ à espera de um grande acontecimento,/mas nunca se dá conta de que é preciso/ir roendo,/roendo,/ um ossoduro de roer.
Isso tudo é Nejar só um pouco.
Os homens donde vieram /com seu destino de pedra? /Que procuravam os homens /na eternidade de pedra? /Eram hálitos de aurora, /luz florescendo caverna? /Eram só pedra. /Talvez fonte, vento-vento, /folhagem sobre montanha, /cintilações, pensamento? /Eram só pedra. /Talvez crianças, relâmpagos, /paredes de som, cantigas? /Eram só pedra. /Rostos ocultos no sono, /barcos de ânsia, velame? /Eram só pedra. /Talvez carícia, sossego, /desejo de despertar? /Eram só pedra de pedra. /Os deuses eram de pedra, /os homens eram de pedra /na eternidade de pedra. /Pedra de aurora, mas pedra, /Os homens eram pedras. /Lábios de pedra, mas pedra. /Os homens eram pedras. /Ventre de pedra, mas pedra. /Os homens eram pedras. /Noite de pedra, mas pedra. /Os homens eram pedras, /os homens eram pedras. /Os homens eram pedras. /Eram as pedras, as pedras. /Eram as pedras.
Esse é Carlos Nejar cuja Graça é poder ver o tempo acordar de vez (Livro do juízo final).
Se fosse possível descobrir a proteína nejariana, ela, como Proteu, nunca se deixaria apreender. Muda de forma, que já é sempre outra. Se quiserem saber quem sou/
- Não sei quem sou/ Só sei que em mim/ A sombra e a luz/ São vultos/ Que se buscam e se amam/ Loucamente.
Ou então em Árvore do Mundo:
Se perguntas onde fui,/ Devo dizer: o mar./Estive sempre ali, /Mesmo estando a mudar/ Foi ali que escrevi /Tua pele, teu suor. /Ao tempo, seus faróis. /Não mudei de mudar. /O que mudou em mim, /senão andar mudando sem nunca mais mudar? /Quem mudará em mim, /se não sei mudar?/Ou me mudei. Sou outro. /Outra ventura, outravirtude, /cadência,remota criatura. /Então que se apresente./Seja tenaz, plausível esse rosto invisível e áspero. /Mudei. Soprava o mar. /Mudei de não mudar.
Para além de tudo, a poesia de Nejar é um grande monumento de fé e esperança.
É preciso esperar contra a esperança. /Esperar, amar, criar /contra a esperança /e depois desesperar a esperança (...) / é preciso desesperar a esperança com um balde de mar. /Um balde a mais /na esperança. /Um balde a mais/ contra a esperança/ e sobre nós (A árvore do mundo).
Obrigado poeta, pelos teus 80 anos de esperança!
Membro da Academia Brasileira de Filosofia
Procurador de Justiça inativo
Carlos Nejar é um homem do pampa, mas sua poesia é universal. Crítico literário, ficcionista e dramaturgo, traduziu Jorge Luis Borges e Pablo Neruda. Um dos mais importantes poetas contemporâneos. Sua obra não se mede no espaço, não cabe no tempo. É de todos os tempos. É o pão da palavra exata. Depois em alma apanhava/ o pão da palavra exata/ E o tempo/na cesta se acumulava.
O poeta completa neste início de janeiro (2019) 80 anos de idade, sendo mais de 50 anos dedicados à criação. Um criador de cosmogonias, como disse o poeta pernambucano César Leal, mas também o autor da mais completa História da Literatura Brasileira, que percorre da Carta de Caminha aos dias atuais, sendo considerado um dos 37 escritores-chave do século, segundo o crítico suíço Gustav Siebenmann.
A propósito, vale lembrar as palavras de João Ricardo Moderno (2016, p. 179) ao dizer: em Nejar, o fetiche da metodologia desfaz-se como gelo. Nejar é a sua própria metodologia. Não precisa de outra e a sua História da Literatura Brasileira é também um manifesto literário. Algo jamais visto desde o início do Modernismo brasileiro. Uma história com sentimentos. Uma história com lágrimas e seres vivos autênticos.
Impossível descrever toda sua obra, desde O Campeador e o Vento (1966). Primeiro, porque como apenas um leitor, não teria a menor condição de fazê-lo senão expressar o quanto a poesia de Nejar é singular e própria. Não cabe em definições. Em nenhum enquadre. Depois, porque o poeta das Quarenta e nove casidas e um amor desabitado (2016) continua a recriar a criação. Como diz em O evangelho segundo o vento: (...)Quando brota a voz humana/ não há quem a detenha.
E não há. Nem tempo nem vento. Nejar é o mais autêntico incessante carpinteiro da palavra.
Recentemente (dezembro/janeiro 2018), foi lançado, por concepção, projeto e edição dopoeta Luiz Coronel, o Dicionário Carlos Nejar. Essa publicação dá uma noção da amplitude da sua obra.
Sempre me impressionei muito com a força de sua palavra. O tom, a modulação com que Nejar exprime o afeto que nela contém. O seu aspecto sonoro é desconcertante. Simbólico. Metafórico. A capacidade de dizer. De dar nome àquilo que anda em busca de nomeação. Pois, se há sempre algo de bruto no homem – e sempre há – esse terror sem nome anseia psicologicamente ser revelado. Pela palavra deseja ser nomeado. Assim: O vento lavou as pedras,/ mas ficaram as palavras./ O vento lavou as pedras /com sabor de madrugada. / O vento lavou as noites, / mas ficaram as estrelas. / (...)/ O vento lavou as águas,/ mas não lavou a inocência/ que amadurece nas águas./ O vento lavou o vento. (Pedra-vento).
A aspereza que nos constitui desde a cena primitiva está sempre à espera de ser polida. A difícil tarefa de transformar a pedra em diamante do afeto. Temos, sim, uma parte disforme dentro de nós, inacabada, inaudita, que busca desesperada e agonicamente uma saída somente possível pela nomeação do eu-palavra. A poesia existe, disse Ferreira Gullar, porque a vida só não basta. Necessita o desvelamento, a atribuição de sentido, daquilo que ainda não tem nome nem pensamento.
A palavra de Nejar, a par de seu vigor audível, decodifica esse material arcaico na medida em que amassa o barro de que é feito o homem, para usar uma imagem de Saramago. O homem que se renasce em cada decifração da palavra. O-sem-significado prende. O sentido compreende. A nomeação liberta. Esse processo de atribuição de sentido em Carlos Nejar passa e perpassa pelo que é sentido. É por isso que as personagens nejarianas se chamam viventes.São vivas em nós e nós somos vivos nelas.
Na bricolagem em que apsicanálise diz: onde o homem pensa, ele não existe, e onde ele existe, ele é lá que ele não pensa, Nejar faz interpretação artística. O ato de atribuir sentido está no inconsciente, não no discurso técnico de uma bula de laboratório. Neste tudo está dito.
A poesia, assim como o ato de descoberta científica, da sentença justa e do encontro místico, está inscrita no mesmo registro de encontro privilegiado com a verdade e com a ternura. Assim, permito-me dizer que poesia de Nejar produz a transformação de nossos elementos beta/brutos em elementos alfa. Resgata, pela mão da palavra, cada um de nós do terror-sem-nome para nos conduzir à condição de sujeito, que é sempre da cultura. Não há terror como/o que já se deu,/ antes de acontecer.
A poesia de Carlos Nejar, dessa forma, deixa fluir o inconsciente. As palavras, os sons, as tonalidades organizam-se através dessa outra percepção, sem tempo, sem espaço. Sem demarcações e sem barreiras. É repleta de condensações e deslocamentos. O ponto de capitonê amarra surpreendentes configurações. Uma palavra sempre outra. Mimetismo do eu. Caleidoscópio de sentidos. Ela se desloca na busca de significados para além do sentido. Sempre ali. Nunca ali. A poesia de Nejar é o pote de ouro de baixo do arco-íris. Palavra-movimento, que não se banha duas vezes na água do mesmo rio. Já é outra novamente. Palavra instante, trovão. Luz e escuridão. É o inconsciente em constante metaforização. Vida, vela, vento, sopro que faz as palavras se abraçarem nelas mesmas. Uma lógica-caesura, que, ao romper, costura. Ao costurar, rompe. É a saga do dizer o nunca antes pensado, intransponível. Sua poesia faz que se torne possível penetrar a inacessibilidade do ser. Por isso é lindeira do trágico.
Nejar é o pensador de pensamentos jamais pensados. Como pensar e dizer o que nunca foi pensado nem dito? Só pela ascese da palavra.
Em Nejar toda palavra é mundo, todo verso é combate. O resto é vento. O vento é o vento;/ as crinas não rompem / o silêncio/ e ao seu galope / retumba a água, / prossegue sempre, / até que o tempo/ desmonte a morte, / no seu galope, / desmonte o tempo. / Prossegue sempre (O Campeador com as rédeas do tempo).
Dessa forma, a poesia de Carlos Nejar nunca volta atrás. Ela faz (re)viver experiências emocionais corretivas do eu na relação de encontro com outros sentidos-viventes.O tempo é gente./Jamais se apossa/ do que não lhe sofre (Idade da aurora).
Em poema-homenagem, Gilberto Mendonça Teles (2017) retrata bem o poeta maior: O verbo nunca esteve no início/ dos grande acontecimentos./ (...) No início ou no fim (tudo é finício)/ a gente lembra de que está mesmo com Deus/ à espera de um grande acontecimento,/mas nunca se dá conta de que é preciso/ir roendo,/roendo,/ um ossoduro de roer.
Isso tudo é Nejar só um pouco.
Os homens donde vieram /com seu destino de pedra? /Que procuravam os homens /na eternidade de pedra? /Eram hálitos de aurora, /luz florescendo caverna? /Eram só pedra. /Talvez fonte, vento-vento, /folhagem sobre montanha, /cintilações, pensamento? /Eram só pedra. /Talvez crianças, relâmpagos, /paredes de som, cantigas? /Eram só pedra. /Rostos ocultos no sono, /barcos de ânsia, velame? /Eram só pedra. /Talvez carícia, sossego, /desejo de despertar? /Eram só pedra de pedra. /Os deuses eram de pedra, /os homens eram de pedra /na eternidade de pedra. /Pedra de aurora, mas pedra, /Os homens eram pedras. /Lábios de pedra, mas pedra. /Os homens eram pedras. /Ventre de pedra, mas pedra. /Os homens eram pedras. /Noite de pedra, mas pedra. /Os homens eram pedras, /os homens eram pedras. /Os homens eram pedras. /Eram as pedras, as pedras. /Eram as pedras.
Esse é Carlos Nejar cuja Graça é poder ver o tempo acordar de vez (Livro do juízo final).
Se fosse possível descobrir a proteína nejariana, ela, como Proteu, nunca se deixaria apreender. Muda de forma, que já é sempre outra. Se quiserem saber quem sou/
- Não sei quem sou/ Só sei que em mim/ A sombra e a luz/ São vultos/ Que se buscam e se amam/ Loucamente.
Ou então em Árvore do Mundo:
Se perguntas onde fui,/ Devo dizer: o mar./Estive sempre ali, /Mesmo estando a mudar/ Foi ali que escrevi /Tua pele, teu suor. /Ao tempo, seus faróis. /Não mudei de mudar. /O que mudou em mim, /senão andar mudando sem nunca mais mudar? /Quem mudará em mim, /se não sei mudar?/Ou me mudei. Sou outro. /Outra ventura, outravirtude, /cadência,remota criatura. /Então que se apresente./Seja tenaz, plausível esse rosto invisível e áspero. /Mudei. Soprava o mar. /Mudei de não mudar.
Para além de tudo, a poesia de Nejar é um grande monumento de fé e esperança.
É preciso esperar contra a esperança. /Esperar, amar, criar /contra a esperança /e depois desesperar a esperança (...) / é preciso desesperar a esperança com um balde de mar. /Um balde a mais /na esperança. /Um balde a mais/ contra a esperança/ e sobre nós (A árvore do mundo).
Obrigado poeta, pelos teus 80 anos de esperança!